Teoria Realista: Realismo nas Relações Internacionais

Teoria Realista: Realismo nas Relações Internacionais

No estudo das Relações Internacionais, o Realismo se destaca como uma corrente de pensamento que prioriza a análise do poder e dos interesses de estado em um ambiente internacional marcado pela anarquia. Originado nas reflexões de pensadores antigos como Tucídides e refinado por teóricos modernos como Hans Morgenthau, Niccolò Machiavelli e Kenneth Waltz, o Realismo fornece um arcabouço teórico robusto para entender a persistência do conflito e a competição entre as nações.

Antes de inciar os estudos sobre o Realismo, recomendo que leia minha publicação: “Teorias das Relações Internacionais: Guia de Estudos“.

História do Realismo

O Realismo continua a ser uma teoria vital, oferecendo insights sobre a natureza inalterável do conflito e da competição internacional, ao mesmo tempo em que se adapta às mudanças do cenário global. Sua evolução ao longo dos séculos destaca sua flexibilidade e relevância perene, fornecendo uma lente crítica através da qual podemos analisar as relações internacionais em um mundo em constante mudança.

O Realismo, como uma teoria dominante em Relações Internacionais, tem suas raízes profundas na história humana, retratando a incessante busca pelo poder como uma característica inalterável das relações entre os estados. Esta jornada intelectual começa com Tucídides, cujas crônicas da Guerra do Peloponeso enfatizam a primazia dos interesses estatais e a luta pelo poder. Sua análise realista da política antiga oferece uma visão atemporal, ecoando através dos séculos até os pensadores modernos.

No contexto indiano antigo, Chanakya, com sua obra “Arthashastra”, aconselhava os reis sobre a importância da astúcia política e do poder militar para a expansão e proteção do estado. Na Europa renascentista, Niccolò Machiavelli, em “O Príncipe”, delineou a necessidade de pragmatismo brutal e a manipulação do poder como ferramentas essenciais para a governança.

A filosofia de Thomas Hobbes e Jean-Jacques Rousseau mais tarde introduziu uma perspectiva sobre como o estado de natureza influencia a ordem social e política, preparando o palco para a formulação mais sistemática do Realismo no século XX por Hans J. Morgenthau.

Em “Politics Among Nations”, Morgenthau estabeleceu os princípios do Realismo, argumentando que a política internacional é governada pela luta pelo poder sob a influência de leis objetivas derivadas da natureza humana.

O Realismo adaptou-se às novas dinâmicas globais, enfrentando desafios como questões transnacionais e a globalização. Teóricos contemporâneos, como John Mearsheimer e Stephen Walt, atualizaram a teoria para refletir a complexidade da política mundial atual, reafirmando a centralidade do poder e dos interesses estatais.

Realismo - Relações Internacionais

Princípios do Realismo em Relações Internacionais

O Realismo, como uma teoria dominante em Relações Internacionais (RI), oferece uma visão pragmática sobre o sistema internacional, baseada em conceitos-chave como autoajuda, soberania, poder, o estado e anarquia. Este post explora esses princípios fundamentais, iluminando como eles moldam a compreensão realista do mundo.

Autoajuda: No coração do Realismo está a ideia de autoajuda, que sugere que, na ausência de uma autoridade global soberana, os estados devem garantir sua própria segurança e interesses.

Soberania: A soberania é vista como a autoridade suprema dentro do território do estado, essencial para a manutenção da ordem internacional sob a ótica realista.

Poder: O poder, frequentemente medido em termos militares e econômicos, é o principal indicador da posição de um estado no sistema internacional, dirigindo a interação entre os estados.

Estado: O estado é considerado o ator principal em RI, com suas ações motivadas pela busca incessante de segurança e poder, refletindo a natureza competitiva da anarquia internacional.

Anarquia: A anarquia descreve a falta de uma autoridade central no sistema internacional, levando a um estado de autoajuda onde a segurança é a principal preocupação dos estados.

Esses princípios não apenas fundamentam o Realismo como uma teoria em RI, mas também oferecem uma lente através da qual podemos examinar as políticas e estratégias dos estados no palco internacional. Ao entender esses conceitos, podemos apreciar melhor as complexidades e desafios da política mundial.

Pilares do Realismo

A teoria Realista se apoia em premissas chave que moldam sua visão sobre a política internacional:

  1. Primazia do Estado: O estado é considerado o ator principal nas relações internacionais, detendo soberania e buscando sua própria segurança e interesses.
  2. Natureza Humana: A propensão ao poder e à desconfiança é vista como uma característica inerente à natureza humana, refletindo-se nas ações dos estados.
  3. Anarquia Internacional: A ausência de um governo mundial cria um sistema de autoajuda, onde os estados devem garantir sua própria segurança sem depender de outros.
  4. Balanceamento de Poder: Para prevenir a dominação por outros estados, os países buscam equilibrar o poder por meio de alianças e capacidades militares.

Os 6 Princípios do Realismo de Morgenthau

Na obra seminal “Politics Among Nations: The Struggle for Power and Peace”, Hans J. Morgenthau estabeleceu os alicerces do pensamento realista através de seis princípios fundamentais que continuam a influenciar o estudo das Relações Internacionais. Estes princípios refletem a complexidade e a permanente relevância do Realismo no cenário global contemporâneo:

  1. Leis Objetivas Governam a Política: Morgenthau argumenta que a política, assim como a sociedade, é regida por leis objetivas que têm suas raízes na natureza humana, destacando a persistência do poder e dos interesses de estado como forças motrizes.
  2. Interesses Definidos pelo Poder: O interesse dos estados, especialmente em termos de poder, molda a política internacional, refletindo a busca contínua por segurança e influência.
  3. A Natureza Variável do Poder: Enquanto o interesse pelo poder é considerado um objetivo universal e objetivo, Morgenthau reconhece que este não é fixo, permitindo nuances e variações conforme o contexto.
  4. Significado Moral da Ação Política: O realismo reconhece a importância moral das ações políticas, enfatizando a necessidade de avaliar os riscos e as realidades pragmáticas ao apoiar aliados.
  5. A Distinção entre Moralidade e Política: Morgenthau adverte contra a confusão entre as aspirações morais de uma nação e as leis morais universais, criticando a justificação de guerras com base em premissas moralistas ou divinas.
  6. O Realismo e Outras Escolas de Pensamento: O realismo se distingue por sua abordagem pragmática e sua capacidade de separar a política de outras esferas, como a economia, a moralidade e o direito, enfatizando a singularidade da análise política em termos de poder.

Estes princípios não apenas fundamentam o Realismo como uma teoria crítica em Relações Internacionais, mas também oferecem uma lente através da qual podemos examinar as complexidades da política global, desafiando-nos a reconhecer a intersecção entre poder, moralidade e os imperativos pragmáticos da política internacional.

Neorealismo - Relações Internacionais - Realismo

Neorrealismo

O Neorrealismo, ou Realismo Estrutural, desenvolvido por teóricos como Kenneth Waltz, argumenta que não são apenas as características internas dos estados que determinam seu comportamento, mas também a estrutura do sistema internacional. O Neorrealismo coloca a anarquia do sistema internacional como a principal influência sobre o comportamento dos estados, sugerindo que as ações dos estados são moldadas mais pela distribuição de poder no sistema do que por suas características internas.

Diferenças Chave

Foco: O Realismo tradicional concentra-se nas características internas dos estados, como desejos de poder e segurança, enquanto o Neorrealismo foca na estrutura do sistema internacional.

Anarquia: Ambas as teorias reconhecem a anarquia como uma característica definidora do sistema internacional, mas o Neorrealismo a vê como a causa principal do comportamento competitivo dos estados.

Segurança vs. Poder: O Realismo enfatiza a busca incessante por poder como um meio de garantir a segurança do estado. O Neorrealismo, por outro lado, sugere que os estados buscam um posicionamento de poder que maximize sua segurança dentro da estrutura anárquica.

AspectoRealismoNeorrealismoRealismo DefensivoRealismo Ofensivo
Sistema InternacionalAnárquico, baseado no poderEstrutura anárquica determina comportamentoAnarquia leva à busca por segurançaAnárquico, incentiva a maximização do poder
Natureza do EstadoUnitário e racional, buscando sobrevivênciaInfluenciado pela posição no sistemaPrevenção contra ameaças é primordialAgressivo, buscando maximizar o poder relativo
Principais AtoresEstados soberanosEstados, com ênfase nas estruturasEstados preocupados com a segurançaEstados como atores racionais buscando hegemonia
Visão sobre ConflitoInevitável devido à competição por poderResultado da distribuição de poderEvitável se os estados buscarem apenas segurança suficienteFrequentemente necessário para aumentar o poder
Estratégia para PazBalanço de poder e diplomacia realistaEstabilidade através da distribuição equilibrada de poderPolíticas de segurança defensivas e cooperaçãoDomínio ou deterrence através de superioridade de poder

Além do Realismo

Realismo: Além da competição pelo poder, o Realismo enfatiza a sobrevivência como a principal motivação dos estados. A teoria sugere que ações morais devem ser secundárias aos interesses nacionais quando se trata de política internacional.

Liberalismo: Caracteriza-se também pela crença na capacidade humana de progresso e na importância dos direitos humanos e da democracia. Argumenta que a paz pode ser alcançada através da cooperação e do engajamento em organizações internacionais.

Marxismo: Além da exploração capitalista, foca na imperialismo e na dominação global pelo capital. Considera que as relações internacionais são um reflexo da luta de classes e propõe que a superação do capitalismo é essencial para a verdadeira liberdade e igualdade.

Construtivismo: Destaca a maleabilidade das estruturas internacionais, argumentando que elas podem ser transformadas através da reinterpretação e redefinição de normas e identidades. Enfatiza o papel do discurso e da comunicação na construção da realidade internacional.

Críticas ao Realismo em Relações Internacionais

O Realismo, uma das teorias mais influentes em Relações Internacionais, tem sido objeto de críticas substanciais que questionam sua visão do mundo e suas premissas fundamentais. Este post explora as principais críticas ao Realismo, refletindo sobre suas implicações para o estudo e a prática da política internacional.

A Natureza Auto Realizável do Realismo

Críticos argumentam que o Realismo, ao enfatizar a luta pelo poder e a competição incessante entre os estados, pode criar uma profecia auto realizável. Essa perspectiva incentiva os líderes a agir baseados em suspeitas, poder e amoralidade, tornando a cooperação internacional e a construção de uma sociedade internacional harmoniosa praticamente impossíveis.

Pessimismo Inerente

O Realismo é frequentemente acusado de ser excessivamente pessimista, vendo a confrontação no sistema global como inevitável. Essa visão limita a capacidade de imaginar e trabalhar por um mundo onde a cooperação e a paz sejam viáveis, sugerindo que os líderes têm pouca margem para superar as realidades da política de poder.

Incapacidade de Prever o Fim da Guerra Fria

Uma crítica significativa ao Realismo é sua falha em prever ou explicar o fim da Guerra Fria e as transformações subsequentes na política mundial. Esse período viu uma redução na competição entre estados e um aumento nas oportunidades para cooperação, desafiando a visão realista de um mundo dominado por conflitos de interesse.

Foco Excessivo no Estado

O Realismo é criticado por sua ênfase excessiva no estado como entidade sólida, negligenciando outros atores e fatores dentro do estado, bem como questões não diretamente relacionadas à preservação do estado. Essa abordagem centrada no estado falha em considerar o impacto de organizações internacionais e movimentos de cidadãos, como demonstrado pelo fim da Guerra Fria.

Críticas à Balança de Poder

A estratégia realista da balança de poder, que busca prevenir que qualquer estado se torne demasiadamente poderoso, é vista por críticos como uma justificativa para a guerra e a agressão. Essa visão sugere que o Realismo pode legitimar conflitos ao invés de promover meios para sua resolução pacífica.

Guia de Estudos – Livros sobre Realismo

Tucídides – “História da Guerra do Peloponeso”: Inicia a sequência histórica com uma análise pragmática dos conflitos entre Atenas e Esparta, estabelecendo a base do pensamento realista sobre o poder e os interesses estatais.

Niccolò Machiavelli – “O Príncipe”: Avança no pensamento realista ao enfatizar a necessidade de pragmatismo e astúcia no exercício do poder pelos governantes.

Thomas Hobbes – “Leviatã”: Descreve a vida em estado de natureza como “solitária, pobre, desagradável, bruta e curta”, justificando o poder soberano como necessário para a ordem social, contribuindo para a visão realista da natureza humana.

Hans J. Morgenthau – “Politics Among Nations”: Sistematiza o Realismo em Relações Internacionais, introduzindo princípios fundamentais que destacam a política de poder como essencial nas relações entre nações.

Kenneth Waltz – “Theory of International Politics”: Desenvolve o Neorrealismo ou Realismo Estrutural, focando na estrutura anárquica do sistema internacional como determinante do comportamento dos estados.

John Mearsheimer – “The Tragedy of Great Power Politics”: Propõe o Realismo Ofensivo, destacando como os grandes poderes estão sempre buscando hegemonia regional ou global.

Stephen Walt – “The Origins of Alliances”: Introduz o conceito de Realismo Defensivo, focando nas estratégias de balanceamento de poder através de alianças.

Robert Gilpin – “War and Change in World Politics”: Examina a relação entre guerra, mudança no sistema internacional e a ascensão e queda de grandes potências.

Barry Buzan – “The United States and the Great Powers”: Analisa a política de poder no contexto pós-Guerra Fria, incorporando elementos do Neorrealismo.

Gideon Rose – “Neoclassical Realism and Theories of Foreign Policy”: Oferece uma ponte entre o Realismo e o Neorrealismo, focando em como as percepções internas dos líderes impactam a política externa.

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Guilherme Bueno
Guilherme Bueno
esri.net.br

Sou analista de Relações Internacionais. Escolhi Relações Internacionais como minha profissão e sou diretor da ESRI e editor da Revista Relações Exteriores. Ministro cursos, realizo consultoria e negócios internacionais. Gosto de escrever e já publiquei algumas centenas de posts e análises.

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