Não é incomum que ao falar sobre direitos humanos automaticamente a análise ou percepção seja de uma área voltada para as questões de segurança pública e de direitos de algumas minorias. Mas afinal, o que são direitos humanos? De acordo com as Nações Unidas, trata-se de um conjunto de direitos e garantias ao qual fazem jus todos os seres humanos, sem distinção de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou qualquer outra condição. Neste rol estão inclusos o direito à vida, à liberdade, ao trabalho, ao reconhecimento perante a lei, à educação, entre outros.
São, portanto, um conjunto essencial de direitos para uma vida digna alicerçada na igualdade, liberdade e dignidade. Assim, não há uma lista fechada desses direitos, uma vez que, de acordo com o contexto histórico surgem novas demandas sociais que passam a integrar esse conjunto de direitos essenciais para a dignidade humana (RAMOS, 2019).
A proteção à integridade física e moral é o que define a dignidade humana, mas, por se tratar de um conceito complexo, não se limita àquilo que pode ser definido pelo respeito às necessidades humanas, nem à preservação dos instintos humanos (ANNONI; VALDES, 2013). Existe uma dimensão da dignidade humana, intimamente relacionada com os direitos sociais ao trabalho, a um sistema de seguridade social eficaz e à proteção de ordem material, para que seja assegurada uma existência digna. E mais, “constitui pressuposto essencial para o respeito da dignidade da pessoa humana a garantia de isonomia de todos os seres humanos” (SARLET, 2010, p. 104).
No campo de proteção, existe uma sistemática internacional de proteção aos direitos humanos, com forte impulso a partir do pós – Segunda Guerra mundial. De acordo com Vieira (2006, p. 14), “a proteção internacional da pessoa humana, como cerne do constitucionalismo contemporâneo é, assim, uma concepção ampliada da Teoria Constitucional, que abrange a proteção da pessoa humana indiferentemente de sua nacionalidade”. A internacionalização dos direitos humanos acontece na esteira do desenvolvimento do sistema das Nações Unidas de direitos humanos, e de sistemas regionais como o interamericano, europeu e africano.
De acordo com Jubilut (2007), hodiernamente, a pessoa humana, no âmbito de proteção internacional, conta com um grande sistema de proteção, alicerçado no Direito Internacional dos Direitos Humanos latu sensu, também chamado de Direito Internacional de Proteção da Pessoa Humana, dividido em três vertentes de proteção: o Direito Internacional dos Direitos Humanos strictu sensu, o Direito Internacional Humanitário e o Direito Internacional dos Refugiados.
Temas emergentes: migrações
As migrações fazem parte da história da humanidade, esse é um fato inegável. Tratá-las como algo excepcional é, portanto, negar a história. Tanto é assim, que surgem diferentes teorias com o objetivo primordial de buscar explicações sobre o porquê dos deslocamentos humanos ao longo do tempo. Desta análise fazem parte fenômenos como a globalização, de caráter complexo e multifacetado, tanto quanto as próprias migrações e que, sobre elas, tem diferentes consequências.
As migrações estão no centro do debate sobre a globalização e sobre as tendências políticas de diferentes países, o que requer, portanto, a análise de alguns equívocos presentes no debate sobre o tema. O primeiro deles, diz respeito às migrações Sul-Norte: tais movimentos não podem reduzir a definição de migrações internacionais como aquelas em que países do norte global recebem a maioria dos migrantes vindos do sul global, pois desconsidera as dinâmicas migratórias regionais, como àquelas entre países latino e centro americanos e entre diferentes regiões da África e da Ásia (GRIMSON, 2011).
A construção de muros, o farto investimento dos Estados mais ricos em políticas de segurança, controle marítimo e de fronteira, não impedem as migrações. Ao contrário, cada vez mais pessoas colocam a própria vida em risco na busca por uma vida estável e segura longe de suas origens. Em tempos de hiper conectividade mundial, a migração internacional é uma realidade que chega a quase todas as partes do mundo. O desenvolvimento dos meios de transporte mais rápidos e baratos, permitem que as pessoas se desloquem em busca de emprego, educação, novas oportunidades e qualidade de vida. Por outro lado, conflitos, pobreza, desigualdade e falta de meios de vida sustentáveis obrigam milhares de pessoas a deixarem suas casas diariamente.
Em um cenário complexo, cabe observar que a análise das migrações internacionais não pode ser considerada apenas a partir do binômio país de origem/país de destino, sem observar fatores como exclusão, desigualdade, violência e caos ambiental. No contexto da globalização, o estudo das migrações deve levar em conta fatores como interculturalidade, classe, raça, gênero e dinâmicas de poder.
Como lembra Zolberg (1989), as migrações internacionais têm caráter essencialmente político, pois é o Estado – Nação soberano quem vai gerir a entrada e saída de indivíduos de seu território. Por outro lado, o ato de migrar ultrapassa a relocalização física, implicando em mudança de jurisdição e mesmo de pertencimento a determinada sociedade.
Trabalhando com direitos humanos
Por se tratar de um tema multidisciplinar, o campo de trabalho para os profissionais que desejam atuar nesta área é amplo, e não se restringe àqueles com formação jurídica: internacionalistas encontram oportunidades de atuação tanto no setor público, quanto em Organizações Não Governamentais, empresas e organizações internacionais.
Trabalhar com direitos humanos tem se mostrado promissor, tanto pela integração de temas sociais, políticos, culturais e econômicos, quanto pela oportunidade de aprendizado em causas e temas coletivos e políticos. No contexto externo, dominar outras línguas, como inglês, francês e mandarim, é um diferencial importante e muitas vezes, pré-requisito.
As agências oficiais das Nações Unidas, que têm escritórios em vários países, oferecem oportunidades de trabalho ou estágio rotineiramente. No campo das migrações, por exemplo, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados – ACNUR e a Organização Internacional para as Migrações – OIM, tem escritórios no Brasil. A Organização dos Estados Americanos – OEA também oferece oportunidades de trabalho remunerado ou voluntariado, muitas delas nos Estados Unidos. Além disso, organizações brasileiras que atendem migrantes, como as Cáritas Arquidiocesanas (vários estados), Missão Paz (São Paulo) e o Instituto de Migrações e Direitos Humanos – IMDH (Brasília) são alguns exemplos de iniciativas onde é possível atuar voluntariamente ou participar de seleções para trabalho remunerado.
Trabalhar com direitos humanos? Sim, é possível!
Aqui vão ainda algumas dicas para a atuação com Direitos Humanos e atualização profissional:
Dica 1: As Nações Unidas possuem uma newsletter – Onu News – que divulga as principais ações e iniciativas no âmbito da ONU, mas também divulga oportunidades de trabalho voluntário e remunerado. (https://news.un.org/pt/).
Dica 2: A Escola Superior de Relações Internacionais preparou um curso de Direitos Humanos e Migrações Internacionais. Se você é um internacionalista que gostaria de atuar nesta área, inscreva-se agora no curso acessando a página através deste link ou clicando na imagem abaixo.
Referências
ANNONI, Danielle; VALDES, Lysian C. O Direito Internacional dos Refugiados e o Brasil. Curitiba: Juruá, 2013.
GRIMSON, Alejandro. Doce equívocos sobre las migraciones. Nueva Sociedad, Buenos Aires, n. 233, p.34-43, maio 2011. Disponível em:<http://nuso.org/media/articles/downloads/3773_1.pdf>. Acesso em: 16 outubro 2021.
JUBILUT, Liliana Lyra. O direito internacional dos refugiados e sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro.São Paulo: Método, 2007.
RAMOS, André Carvalho. Curso de Direitos Humanos. 6ª ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
SARLET, Ingo W. A eficácia dos Direitos Fundamentais: uma teoria geral dos direitos fundamentais na perspectiva constitucional. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010.
VIEIRA, Gustavo O. Inovações em Direito Internacional: um estudo de caso a partir do Tratado de Ottawa. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2006.
ZOLBERG, A. R. A Nation by Design – Immigration Policy in the Fashioning of America. New York: Russell Sage Foundantion, 2006.